terça-feira, 6 de novembro de 2012

O Homem e o Mar: desafios da conservação dos oceanos



Um dos temas que constaram do documento final da Rio+20 como merecedor de especial atenção das Nações Unidas e da humanidade em geral foi a degradação dos oceanos e a importância primordial do uso dos seus recursos de forma sustentável, com particular realce à situação das áreas oceânicas fora da jurisdição de qualquer país.


Não tão visíveis quanto os desmandos humanos nas áreas terrestres, que estão facilmente à vista de todos, as agressões aos mares permanecem ocultas sob a aparência ilusoriamente intocada de sua superfície, excetuando-se apenas a concentração de detritos diversos em determinadas áreas. Contudo, os oceanos já estão fortemente impactados pelas atividades humanas, especialmente quanto ao aquecimento gradativo de suas águas, com efeito devastador sobre as ricas formações de coral, à acidificação crescente devida à absorção do dióxido de carbono (CO2) da atmosfera, à eutroficação de amplas regiões nas proximidades da foz de rios que atravessam grandes áreas cultivadas e, por fim, a devastação da fauna marinha em função da pesca abusiva amplamente competitiva e fracamente controlada.

Uma das soluções parciais indicadas para minorar alguns desses problemas – mas evidentemente não todos – é o estabelecimento de áreas protegidas, onde os efeitos das ações humanas deletérias possam ser eliminadas ou pelo menos atenuadas. Esta providência depende porém, necessariamente, da questão de jurisdição dos Estados sobre as extensões oceânicas.

"No Alto Mar, todos os Estados têm direito à pesca (...) Limitados apenas por restrições vagas e imprecisas, na prática, a pesca é na
 verdade livre."

Quem manda no Mar?
O uso do mar para quaisquer fins é fundamentalmente regulado pela Convenção das Nações Unidas dobre o Direito do Mar, um extenso documento com 320 Artigos e nove Anexos, cuja elaboração custou árduos trabalhos e gerou demoradas discussões durante 15 anos, até sua conclusão em 1982. Segundo nela estipulado, os oceanos sob o aspecto de jurisdição dividem-se em três tipos de regimes: o Mar Territorial, faixa ao longo das costas dos diferentes países, com 12 milhas náuticas (22,25 km) de largura, a Zona Econômica Exclusiva (ZEE), que se estende até a distância de 200 milhas (370,80 km) da costa e, em toda a enorme área restante, o Alto Mar.

No Mar Territorial, o Estado costeiro tem soberania plena sobre as águas e o fundo do mar, embora os demais países conservem alguns direitos, como por exemplo a passagem de navios. Na ZEE, o Estado costeiro mantém direitos exclusivos sobre os recursos vivos e não-vivos das águas e do fundo do mar, devendo porém explorá-los de forma sustentável e, quanto à pesca, ceder aos outros países o que exceder à sua capacidade de exploração. No Alto Mar, nenhum país tem soberania, a pesca é praticamente livre e os recursos minerais do fundo são considerados pertencentes à humanidade, sendo sua exploração regida por uma instituição denominada Autoridade, para isto especialmente prevista na Convenção.

Há ainda a considerar o que se denomina Plataforma Continental, geologicamente definida como a extensão submarina dos continentes, mais rasa e fisicamente distinta do fundo do mar que a sucede. Quando esta formação geológica excede os limites da ZEE, o Estado costeiro tem direito aos recursos vivos e minerais do fundo do mar na área excedente, mas não aos das águas sobrejacentes.


O Alto Mar é de todos e de ninguém


Esses conceitos são essenciais para que se definam os direitos e as obrigações dos países quanto à conservação da diversidade biológica marinha. Estipula a Convenção que no Mar Territorial o Estado costeiro é responsável pela preservação do meio ambiente, pelo controle da poluição e pela conservação dos recursos vivos. Na ZEE ele também é responsável pelas medidas de conservação da biodiversidade, incluindo a fixação dos limites de captura do pescado, mas permitindo a outros Estados o uso dos excedentes que não utilizar, sempre de forma sustentável.

No Alto Mar, todos os Estados têm direito à pesca, mas deverão obedecer às obrigações decorrentes da participação em eventuais organizações regionais ou sub-regionais em que possam participar com outros Estados, devendo ainda com todos cooperar nas medidas necessárias à conservação e gestão dos recursos vivos. Limitados apenas por essas restrições vagas e imprecisas, na prática, a pesca é na verdade livre.

Esses direitos e deveres indicam que o estabelecimento de áreas protegidas é legalmente possível no Mar Territorial e na ZEE, a critério dos Estados costeiros, mas nenhum deles pode estabelecê-las no Alto Mar, onde abusos ocorrem com freqüência, impactando severamente diferentes espécies e os ecossistemas marinhos em geral. 

É oportuno lembrar que na Conferência de Nagoya, realizada no Japão em 2010, foram acordadas as chamadas Metas de Aichi, segundo as quais os Estados deveriam conservar 10% das áreas marinhas e costeiras sob sua jurisdição. No Brasil, as áreas marinhas sob proteção ainda pouco excedem 1%, e na maioria dos outros Estados a meta também não foi atingida, embora uns poucos venham dando crescentes cuidados à questão. O documento final da Rio+20 mencionou o aspecto crucial da conservação marinha fora das jurisdições nacionais, mas exceto quanto ao reconhecimento do grande problema, nada de concreto foi alcançado.


Frente a esta lamentável realidade, a riquíssima biodiversidade marinha continua amplamente negligenciada no Alto Mar e também em amplas parcelas das áreas sob a jurisdição nacional de grande número de países, permanecendo desprotegida e devastada impunemente.


Fonte: http://www.oeco.com.br


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